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A vaca deu à luz um homem, o agricultor regozijou-se com a dádiva do destino (história).

por Pedro Henrique Lameira

Valery tinha uma pequena quinta na aldeia, para onde foi depois de uma discussão com a mulher. Isto acontece frequentemente quando os cônjuges não chegam a acordo sobre algumas questões.

Ele próprio não a compreendia, ela não o queria compreender e, como resultado, viviam ambos em cantos diferentes e não se falavam, mas Christina não foi expulsa do apartamento. Apesar de o apartamento lhe pertencer a ele.

Nunca pediram o divórcio, mas a disputa entre eles era bastante séria. Estiveram casados durante cinco anos, mas não tiveram filhos. Valera queria muito ter um filho, mas Kristina parecia não o querer. Ela evitava sempre falar sobre o assunto. Um dia, Valeri balbuciou novamente que gostaria de ter um herdeiro. Cristina olhou para cima e começou a falar sobre como seria bom arranjar um emprego, ter um rendimento em casa e depois sonhar com um herdeiro.

Valery ficou estupefacto. Bem, a culpa era dele por não ser aceite em lado nenhum e ser considerado um leproso. Afinal, ele podia ficar sozinho com uma criança enquanto a mulher estava a construir uma carreira. Já agora, isso não é um problema nos países desenvolvidos.

Cristina olhou para ele e sugeriu-lhe que emigrasse para esses países muito avançados e encontrasse outro idiota qualquer, mas ela não ia gerar pobreza. O incidente terminou. Valera já não podia ficar com ela no mesmo apartamento. Bate com a porta e vai-se embora.

Ficou em casa de um amigo durante alguns dias e depois decidiu fugir para o campo – de qualquer modo, não se estava a dar bem na cidade. Aqui, ele, um criador de gado certificado, não tinha utilidade para ninguém.

Valery passou a maior parte da sua vida na aldeia e sentia que pertencia aqui. Ainda lhe restavam algumas poupanças. Vendeu o seu carro velho, pediu um pequeno empréstimo e abriu uma quinta.

No início foi difícil, não havia dinheiro suficiente para nada, mas depois, por acaso, conseguiu negociar com o dono de uma loja de automóveis e deu-lhe um ovo. O dinheiro também foi suficiente para comprar forragem para as ovelhas.

Em pouco tempo, o número de cabeças de gado duplicou e a carne começou também a gerar rendimentos. Foi então que Valera pensou numa vaca, e não apenas numa.

Ainda faltava muito para o momento em que ele se iria pôr de pé. Claro que o principal sonho de Valera era comprar um carro de luxo, chegar a casa de Cristina e atirar um maço de dinheiro para cima da mesa, ou melhor ainda, a mala inteira para os pés dela. Olhar para ele com orgulho e perguntar: “E então, já tens idade para dar à luz o meu filho?

Por alguma razão, Valery não pensou, nem nos seus sonhos mais loucos, que seria capaz de se divorciar e encontrar outra mulher. Por alguma razão, ele queria expulsar Christina, quebrá-la e certificar-se de que era ela quem lhe daria um filho.

A quinta não se desenvolveu tão rapidamente como Valery gostaria, por isso a mala com dinheiro aos pés de Cristina permaneceu nos seus sonhos e imaginação.

Afinal, tinha aparecido um bezerro na sua quinta. Valery rejubilou como um homem possuído. Como se, em vez de uma vaca, tivesse finalmente um filho. Cuidou dele, acarinhou-o, mimou-o literalmente, soprou-lhe o pó. Toda a gente sabe que uma vaca não pode apenas dar leite, para isso precisa de dar à luz um bezerro.

Sendo criador de gado, Valery sabia o que era necessário e fez tudo para garantir que a sua vaca desse à luz um vitelo. Quando a gravidez da vaca foi confirmada e as suas ancas começaram a arredondar suavemente, o dono abraçou-a com o cuidado e a atenção que nem todas as mulheres merecem.

O tempo passou e Valery estava à espera do primeiro vitelo na sua quinta. Uma noite, foi ao estábulo para ver como estava o seu animal preferido. O homem não fazia ideia de que tudo se passaria tão depressa.

Havia um bezerro deitado na palha e, estranhamente, parecia que não estava sozinho. É isso que são os cuidados, o afeto e o amor. A vaca agradeceu ao seu dono com dois bezerros de uma só vez.

Agora, o mais importante era que a vaca aceitasse os dois e alimentasse cada um deles. Valery ia dia e noite ao estábulo e verificava-o. Um dia viu dois vitelos a alimentarem-se. Um dia, viu dois vitelos a alimentarem-se no úbere. Este facto deixou-o extremamente feliz. Valery chegou mesmo a pensar que o seu primeiro desejo era telefonar a Cristina e contar-lhe os seus êxitos e conquistas. Mas o insulto à sua mulher ainda era demasiado profundo.

Para não perturbar a vaca, Valeri tentou não a incomodar demasiado. Ele queria mesmo ver bem os dois bebés. Conseguia ver bem a primeira cria, mas a segunda parecia um pouco mais pequena e ainda estava escondida atrás de um irmão ou de uma irmã, Valeri não sabia ao certo.

A vaca mastigava comedidamente e lambia as duas crias a intervalos regulares. Valeri já tinha visto estes dois a alimentarem-se de leite muitas vezes, por isso não tinha razões para se preocupar.

Foi o primeiro a desenhar o rosto do vitelo que tinha visto antes. Era branco como a neve, com uma pequena mancha laranja de lado.

O segundo vitelo… Valery olhou para ele e ficou chocado. Durante alguns segundos, não conseguiu acreditar que tal coisa fosse possível. Depois voltou a si e agachou-se. O bebé estava deitado na palha ao lado do bezerro. Um bebé humano.

O homem apercebeu-se de que uma vaca não poderia ter feito tal milagre, mas, mesmo assim, ali estava um bebé totalmente humano deitado à sua frente.

O rapaz não era um recém-nascido. Parecia ter cerca de três, talvez quatro anos de idade. Valera não era boa com crianças. O rapaz agarrou-se à cria e olhou com medo para o tio desconhecido que Valera era para ele. Era bastante óbvio que o bebé tinha fugido de algum lado, ou tinha sido abandonado, ou talvez simplesmente perdido.

Havia poucas famílias numerosas na aldeia onde Valera vivia. Pais desempregados e bêbados ou mães solteiras – tudo podia acontecer num ambiente destes.

Valery sorriu, estendeu as mãos ao rapazinho e, ao mesmo tempo, perguntou-lhe como se chamava. A criança parecia incrédula, confusa, mas não conseguia responder a nada. Apenas balbuciava como as crianças com menos de um ano, numa língua que só ele próprio conhecia.

Era óbvio que a criança não conseguia falar. Valera pegou nele e levou-o para dentro de casa. O rapaz precisava de algo para vestir. Algures na bota estavam as suas próprias roupas de criança, Valera encontrou algo de tamanho adequado. O rapaz olhou para as roupas com tal espanto que riu um riso de cócegas quando Valera as experimentou.

Pareceu a Valéria que o rapaz não só não sabia falar, como também nunca tinha visto as roupas uma única vez na vida. Depois de Valerii ter dado de comer à criança, começou a pensar no que fazer com ela. A propósito, o rapaz comia da mesma forma que os animais: pegava na comida com a boca, empurrava-a para dentro de si com as mãos e, se pudesse, provavelmente ajudava-se a si próprio com os pés.

Valera chamou a polícia. Explicou-lhe a situação. Ele coçou a nuca durante muito tempo, perguntando-se o que fazer com o rapaz e de onde é que ele tinha vindo. Tinha de fazer um relatório e chamar as autoridades tutelares.

O polícia pensou em quem poderia ser a pessoa envolvida no caso, de quem era o filho. Mas não pensou em nada. O rapaz não se parecia em nada com um possível membro da família disfuncional que o rodeava.

Tinha a barba feita, a pele lisa, o cabelo grisalho e os olhos azuis – um homem bonito. Além disso, nunca ninguém tinha sido dado como desaparecido e não parecia haver nenhuma mulher grávida na zona ultimamente.

Disseram que só chegariam na próxima semana, que não tinham transporte. E surgiu a questão de para onde levar o bebé. A Valery aceitou ficar com ele. Gostou do rapaz à primeira vista.

Passou uma semana, depois outra. O rapaz revelou-se muito inteligente, repetia tudo a seguir a Valer e já tinha aprendido a usar uma colher.

As autoridades tutelares estavam sempre a adiar a visita, a aldeia não é uma cidade, nada acontece aqui rapidamente.

Um dia, Valera sentou-se em casa e brincou com um rapaz. Chamava-lhe Danya e ele respondia-lhe de bom grado. Alguém bate à porta. Valera deixou a criança no quarto e foi abrir a porta.

A sua surpresa não tem paralelo. Cristina estava à porta. A mulher veio fazer as pazes, disse a Valera que tinha saudades dele e que não podia viver sem ele. O problema com o seu comportamento era.

Christina tinha-se submetido recentemente a um check-up e descobrira que não podia ter filhos. Com a sua frieza e as suas palavras arrogantes, ela esperava afastar o marido. Cristina achava que não tinha o direito de o privar da oportunidade de constituir família com uma mulher de pleno direito, capaz de lhe dar um filho.

Valera ouvia a mulher e não acreditava no que estava a ouvir.

Por vezes, as mulheres dão cabo da cabeça quando estão desesperadas.

– Quero apresentar-te a uma pessoa – disse Valera e levou a mulher para o quarto onde tinha deixado Danya.

O rapaz dormia tranquilamente num tapete entre os brinquedos e abraçava um ursinho de peluche. Cristina tinha ouvido a história de como ele tinha aparecido na casa deles, e agora não conseguia acreditar no que ouvia.

Em breve, uma tia pesada e disforme apareceu à sua porta, cheirando a perfume barato. Rapidamente olhou para a sala e, sem olhar para o rapaz, começou a escrever qualquer coisa no seu caderno.

– Desculpe, mas eu gostaria de adotar o rapaz”, disse Valera em voz baixa.

– Só se a sua mulher concordar, – disse a mulher, sem tirar os olhos do caderno.

– E eu concordo”, disse Cristina e saiu do corredor.

A mulher gigante pediu a Valera que colocasse algumas assinaturas nos papéis e saiu.

A adoção foi relativamente rápida, e Valery encontrou a família com que tinha sonhado. É verdade que não conseguiu ganhar uma mala de dinheiro, mas isso não importa quando se tem uma mulher e um filho amados.

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